Ordenação sacerdotal de Dom Tomás de Aquino

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Os Judeus e o Muro das Lamentações

Expulsos da cidade santa ao tempo do Império romano e bizantino, podiam os Hebreus, uma vez por ano e pagando pesado tributo, conseguir permissão de entrada, a fim de orarem e chorarem junto a esta sagrada muralha [das Lamentações][1]. E aí está como aquele povo, que por tão baixo preço comprara o sangue do Filho de Deus, que se mostrara insensível às suas dores e às suas lágrimas, que chamara sobre sua cabeça o sangue divino inocente, foi constrangido a comprar, durante séculos, a peso de ouro, uma vez por ano, o consolo de poder chorar sobre as ruínas de sua pátria, de seu templo e de sua grandeza. Terrível castigo pelo grande pecado! Espantosa justiça de Deus!

Hoje, eles podem habitar em Jerusalém[2] e, conquanto lhes seja proibido, sob pena de morte, pisar a sagrada plateia superior, é-lhes facultado livre acesso à muralha das lamentações.


Raro é não se encontrar ali alguém em melancólicas contemplações, quer lendo a Bíblia, quer recitando salmos. O autor destas linhas já os viu de pé, a cabeça descoberta, em sinal de dor, ou sentados em blocos desprendidos do alto, ou eretos, a fronte repousada na muralha, beijarem e beijarem frequentemente e banharem muitas vezes de lágrimas essas pedras que lhes recordam grandeza e glória extintas.

Todas as sextas-feiras, ou por ocasião das festas, numerosos grupos se recolhem ali, ao pôr do sol, como em lugar já aprazado, os homens separados das mulheres. Não se vê aflorar o sorriso ao rosto de quem quer que seja, nenhum indício de alegria, mas uma seriedade entristecida, que nos recorda um povo ferido pela desventura e cujo aspecto nos punge. Ouve-se fraco murmúrio: há ali quem leia, quem reze, quem acenda vela, que faça arder por entre as frestas das enormes pedras daquele imenso paredão, até à chegada do Rabino que preside a reunião e entoa triste ladainha de lamentações...

Ele começa: Por causa do Templo que está destruído, ao que o coro responde: Aqui estamos solitários e chorando. Depois: Por causa dos Sacerdotes que esmoreceram, ao que o coro responde: Aqui estamos solitários e chorando.
O Mudo das Lamentações (foto de 1929), antiga Fotaleza de Herodes



E assim prosseguem confessando os pecados dos seus antepassados, de seus reis, de seus Sacerdotes, queixando-se do mal que sobre eles recaiu, para terminarem na mais que milenária e sempre vã invocação:

Que a paz e a felicidade entrem em Sião.Que o rebento da raiz de Jessé floresça em Jerusalém!

Pobres infelizes! Reconhecem e deploram os pecados de seus pais, mas não reconhecem, nem deploram o maior de todos eles e, com isto, se tornam nele solidários com seus pais. Em meio de tanta luz de milagres e argumentos, que provam a divindade de Jesus Cristo, obstinam-se em desconhecê-lo, mantém-se pertinazes em seu ódio e conservam-se cegos. Inútil é, pois, seu pranto e a ira de Deus e o sangue de Cristo, que invocaram sobre a própria cabeça, pesam sobre eles, de geração em geração, constantemente, como interminável maldição, até que, abandonada a incredulidade, de acordo com as divinas promessas[3], sejam de novo enxertados na árvore da vida.

De Lai, Cardeal Gaetano. A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo. Porto Alegre: Ed. Paulinas, 1955.



[1] Refere-o S. Jerônimo, testemunha ocular: “Ut ruinam suae civitatis eis flere liceat, pretio redimunt... Ut qui olim emerunt sanguinem Christi, emant et lacrimas suas” (In I Sophon.) E, com S. Jerônimo, muitos outros.
[2] Eram nestes últimos anos para cima de 60.000, hoje, talvez, ainda mais, estavelmente domiciliados na cidade santa.
[3] S. Paulo, aos Romanos, XI.

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